3º Bispo – Dom Octávio Chagas de Miranda

Do nascimento ao episcopado

Octávio Chagas de Miranda nasceu no município de Campinas (SP) no dia 10 de agosto de 1881. Era filho de Francisco Chagas de Miranda, maquinista da Companhia Paulista de Estrada de Ferro, e Cândida Maria Teodora Miranda, mulher piedosa e catequista da Matriz velha de Campinas. Teve mais cinco irmãos: Laudelino, Olímpio, João, Amélia e Lídia.

Quis os desígnios de Deus que o jovem padre João Batista Corrêa Nery, recém-ordenado, fosse nomeado coadjutor com direito à sucessão do Reverendíssimo pároco da Matriz do Carmo de Campinas, o padre Francisco de Abreu Sampaio. Essa era a Igreja frequentada pela família do jovem Octávio.

Padre Nery, dentro de suas atividades pastorais, organizou um grupo de coroinhas, do qual fazia parte o pequeno Octávio. Aqui, podemos nos antecipar que desses jovenzinhos, muitos foram ordenados padres e outros três chegaram à dignidade episcopal, sendo eles: Dom Francisco de Campos Barreto, Dom Joaquim Mamede da Silva Leite e Dom Octávio Chagas de Miranda.

Cônego Augusto José de Carvalho (Uma vida dedicada à Igreja em Pouso Alegre: centenário de Dom Octávio Chagas de Miranda. 1981), em seu livro comemorativo pelo centenário de vida de Dom Octávio, assim escreve: “Candinha desejava ardentemente que um de seus três filhos varões fosse padre. Chegou a sondar Laudelino, mas viu logo que com o seu gênio arredio de tudo e de todos, ele que não se adaptara quando mais criança ao grupo de coroinhas do Padre Nery, também agora, já bastante crescido, com seus 16 anos de idade, não iria aceitar ir para o Seminário. Olímpio e João ainda eram muito crianças e nem sabiam escolher nada na vida. Octávio, desde pequeninho, só falava em ser padre. Era piedoso e extraordinariamente dedicado às coisas da Igreja. A quem lhe perguntasse o que desejava ser na vida, ele prontamente respondia: ‘quero ser padre’. Candinha vislumbrou logo, sentimento de mãe não falha, que seu Octávio era o eleito de Deus e seu coração se encheu de santa alegria”. (pág. 33)

O piedoso padre Nery, vendo a dedicação, disponibilidade e percebendo sinais de vocação, decidiu enviar Octávio para o colégio dos padres da Companhia de Jesus, em Itú. Terminando o curso de humanidades, mudou-se para São Paulo, para cursar Filosofia no ano de 1986. Padre Nery foi escolhido para o episcopado, mas seu pupilo, Octávio, não o abandonou. No dia 21 de julho de 1901, Dom João Batista Corrêa Nery toma posse na Catedral de Pouso Alegre e ao estudante Octávio foi dado o cargo de chanceler da Mitra.

Mesmo seminaristas, o jovem Octávio era o braço direito de Dom Nery, principalmente nas questões financeiras. “Octávio, na realidade, parecia um velho e experiente economista dirigindo os negócios materiais de uma diocese. A situação financeira do Novo Bispado, desde seu início, já não foi nada lisonjeira. A Santa Sé, que a princípio não quis aprovar o primeiro patrimônio organizado pelo Padre Joé Paulino, em vista da necessidade de erigir logo a nova diocese, que premida por promessas do Núncio Apostólico e dos Bispos de São Paulo e Mariana, de que estabelecido o Bispado seria bem mais fácil levantar fundos patrimoniais (já naquela época o mineiro era desconfiado e gostava de ver para crer), passou a fazer vistas largas às cifras, criando a nova diocese sem patrimônio suficiente para um equilíbrio estável e permanente”. (1981, pág. 59).

Segundo registros históricos (1981, pág. 59), o patrimônio do novo bispado era de apenas dezoito contos e quinhentos e trinta e três mil réis. Mas o trabalho de Octávio foi tão positivo que em dois anos “o saldo disponível para a manutenção da diocese havia centuplicado e todos os negócios andavam em ascensão” (1981, pág. 60). Em um período de dois anos ele também organizou e construiu a construiu a nova residência episcopal, a qual foi inaugurada em 1905. 

Dois anos antes, porém, no dia 04 de dezembro de 1903 ele foi ordenado diácono. Já no dia 20 do mesmo mês, na Catedral do Bom Jesus em Pouso Alegre, Octávio foi ordenado padre. Ele assim escreveu à sua mãe, em Campinas:

“Pouso Alegre, 18 de novembro de 1903

Querida mãe:

Aproximando-se a data da minha ordenação sacerdotal, guardo ainda na lembrança o dia em que parti de casa para buscar o meu ideal na vida. Parece que faz tanto tempo! Mas ainda conservo bem viva em minha memória aquela despedida. Recordo que me abençoaste com tuas mãos trêmulas, chorando de emoção. Eu era ainda tão criança, e partia naquele instante para tão longe. Mas, Deus foi bom comigo, e me deu forças para suportar a tua ausência e de todos mais, durante estes anos todos, conservando sempre firme a minha vocação.

Agora estou me preparando para fazer os meus últimos votos, e á medida que se aproxima esse grande momento de minha vida, meu coração exulta de felicidade por atingir, finalmente, o meu ideal.

Minha ordenação será em 20 de dezembro, e neste dia a minha felicidade não seria completa sem a tua presença e de todos os que me são caros. Sei que todos me acompanharão na minha alegria, e peço que rezem nesse dia, juntamente comigo, em minha intenção especial, pedindo a Deus que me torne seu digno e humilde servidor. 

Dom Nery faz questão de hospedar-te em casa de sua mãe, dona Maria do Carmo, a qual já está preparando acomodações”. 

A primeira missa do neossacerdote ocorreu na manhã do dia 21 de dezembro. “Dom Nery, quebrando usos, costumes e protocolos, fez questão de ser ‘presbítero assistente’, o que tem direito o neossacerdote na sua Primeira Missa. Foi um gesto bem marcante de humildade de S. Excia. E uma manifestação do quanto ele Bispo queria o seu coroinha, seu amigo e companheiro de todas as horas, e agora seu padre mais querido, a quem já preconizava um futuro venturoso para a Santa Madre Igreja”. (1981, pág. 64).

De volta para Campinas

Dom Nery permaneceu como Bispo de Pouso Alegre por oito anos, quando, em 30 de outubro de 1908, foi transferido para o recém-criado Bispado de Campinas. “Ligado ao padre Octávio, por laços de íntima amizade e pelo afeto de pai espiritual, Dom Nery não podendo dispensar o seu caríssimo auxiliar, pela confiança que ele lhe inspirava, como pelos inestimáveis serviços que prestava, decidiu então, que o mesmo o acompanharia na sua transferência para Campinas”. (1981, pág. 78).

Dom Octávio Chagas de Miranda – 3º Bispo de Pouso Alegre

O território da diocese de Pouso Alegre não era tão grande e por isso muito se questionava a elevação à sede episcopal. Além do mais, outros problemas, como a questão econômica, faziam com que a escolha do novo bispo foi feita com muita atenção. 

Por isso é que Dom Nery, o primeiro bispo de Pouso Alegre e conhecedor profundo daquelas terras sulmineiras, foi consultado sobre o nome ideal para ser o novo Pastor da Diocese. 

“É de supor também que o Núncio Apostólico tenha recorrido a Dom Nery e que este tenha colocado entre os três nomes indicados, como era costume da época, o Cônego Octávio. Julgava-o merecedor da escolha e o padre que reunia três pontos importantes para ser Bispo de Pouso Alegre; conhecimento ‘in causa’ e ‘in loco’, ‘vivência anterior em Pouso Alegre’ e ‘amor à cidade onde estudou e trabalhou na construção da própria Diocese’.

Foi assim, que, em 14 de fevereiro de 1916, Campinas recebeu festivamente a notícia da eleição do Vigário da Matriz Velha, Cônego Octávio Chagas de Miranda, para a alta dignidade de Bispo Diocesano de Pouso Alegre, no Sul de Minas”. (1981, pág. 87).

A ordenação episcopal do Cônego Octávio se deu no dia 04 de junho de 1916. Como ordenantes auxiliares estavam Dom Francisco de Campos Barreto (Bispo de Pelotas – RS) e Dom Antônio Augusto de Assis (Bispo de Guaxupé – MG). O ordenante principalmente, não poderia ser diferente, foi Dom Nery. Também estava presente Dom Vieira, muito doente e numa cadeira de rodas. Dom Vieira, ou padre Vieirinha, foi quem amparou o menino Octávio e garantiu que ele continuasse os estudos no Seminário em São Paulo. 

“Dentre os muitos padres presentes, se apresentou um que tinha sido colega do novo Bispo, o Cônego Samuel Fragoso, que lhe foi dizendo, mais ou menos assim: ‘na sua ordenação em Pouso Alegre, não me foi possível comparecer, mas não poderia por nada perder a sua Sagração aqui em Campinas. Aliás, sempre suspeitei que você acabaria com uma mitra na cabeça, gracejou ele. Desejo-lhe toda felicidade no seu múnus episcopal’”. (1981, pág. 88).

O 3º Bispo de Pouso Alegre, Dom Octávio Chagas de Miranda, chegou à sua Diocese no dia 28 de junho de 1916, tomando posse um dia depois, no dia 29 de junho. 

O calvário de Dom Octávio

Dom Octávio começou seu calvário de sofrimento no ano de 1948, quando começo a sentir os primeiros sintomas do mal de Parkinson. Sem o vigor de antes, perdendo a voz e com outras sequelas, visitadores por ele nomeados passam a substituí-lo nas visitas pastorais. 

Apesar da doença e restringindo a trabalhos dentro da própria cidade de Pouso Alegre, Dom Octávio sempre se fez muito presente. Ele empenhou-se em desenvolver a Ação Católica na Diocese e também as Congregações Marianas, masculina e feminina. Em 6 de maio de 1948, lançou a primeira pedra da nova Catedral. 

O nome de Dom Octávio até chegou a ser cogitado para Campinas, sua terra natal, o que não se concretizou. “Talvez por causa da sua saúde já debilitada, o convite ou aceno da Nunciatura não se confirmou, sendo indicado outro Bispo para Campinas. A desilusão feriu e magoou profundamente o coração de Dom Octávio. Foi quando o mal começou a se agravar ainda mais e em poucos meses, Dom Octávio fisicamente se transformou, acelerando sintomas dos mais diversos: tremedeira, angústia, pavor de tudo, vergonha de se apresentar em público, de pregar etc”. (1981, pág. 144).

Em 1955, Dom Oscar de Oliveira, do clero de Mariana, foi enviado como Bispo Auxiliar para Dom Octávio. Apesar de muitos acreditarem que a chegada do Auxiliar amenizaria a doença, Dom Octávio começou a piorar. Seu cérebro foi se debilitando pouco a pouco, afetando seus sentidos e sua coordenação motora. 

Cônego Carvalhinho assim narrou os últimos momentos de Dom Octávio: 

“O médico assistente, Dr. Jésus Ribeiro Pires, estava sempre junto a seu enfermo. Agora, principalmente postara-se à sua cabeceira, seguindo, desde horas, a sua respiração, controlando pulsação, pressão e todo o sintoma que denunciasse realmente o fim. 

Dr. Jésus Ribeiro Pires foi médico de Dom Octávio, desde que se manifestaram os primeiros sintomas da terrível enfermidade (…) Enquanto conservava sua consciência e o conhecimento exato que se passava em sua volta, ficava contente de ver a seu lado o médico amigo. E isso era sempre manifestado com um sorriso de gratidão e afeto. Já residente em Mariana, onde era Arcebispo, embora continuasse Administrador da ‘Sede Vacante’, Dom Oscar não estava presente quando Dom Octávio morreu.

Afirmou alguém que com ele estava ao chegar a notícia do falecimento de seu colega e amigo, que chorou antes de tomar qualquer providência, como lhe competia. Rodeado de padres e amigos que jamais o abandonaram, tendo à sua cabeceira seu cunhado Eduardinho Gouvêa, sua cunhada Ana Ribeiro de Miranda e o velho amigo de tantos anos, seu irmão preto Mirabeau Ludovico, o venerando Pastor, depois de 44 anos e 4 meses dirigindo a Diocese de Pouso Alegre, entregou sua alma nas mãos de Deus.

A cena foi rápida:…D. Aninha encostou aos seus lábios imóveis o Crucifixo, Mirabeau Ludovico juntou suas mãos, enquanto duas lágrimas de despedida anunciavam o fim. Dr. Jésus abrindo e fechando seus olhos agora sem brilho, confirma:

– ‘Está no céu…’Sim, era o céu, o paraíso dos santos, a morada dos anjos, para onde um novo Querubim da terra carregado de méritos, porque seguiu as bem-aventuranças eternas, ia entrar. E a triste cena terminou: O velho amigo Mirabeau Ludovico fechou os olhos de Dom Octávio, cruzou-lhe as mãos e pronunciou chorando a sua despedida:

– ‘Adeus, meu grande amigo!…’” (1981, págs.149-151)

Era 29 de outubro de 1959