#Reflexão: 32º Domingo do Tempo Comum (10 de novembro)
A Igreja celebra o 32º domingo do Tempo comum, neste domingo (10). Reflita e reze com a sua liturgia.
Leituras:
1ª Leitura: 1Rs 17,10-16
Salmo: 145(146),7.8-9a.9bc-10 (R. 1)
2ª Leitura: Hb 9,24-28
Evangelho: Mc 12,38-44
DOAR-SE DE CORAÇÃO E COM FÉ
Jesus, finalmente, chegou a Jerusalém. Em nossas últimas celebrações, fizemos juntos o caminho que conduzia os peregrinos da Galileia (Norte) até a Cidade Santa, Jerusalém (Sul). Hoje Jesus se encontra no Templo e lá ocorreram alguns confrontos com as autoridades religiosas: ele expulsou os vendedores de animais do Templo; diversos grupos dirigentes da religião judaica se revezaram para debater com Jesus, mas foram desmascarados em suas intenções e perderam no discutir com Jesus, pois mostrou o verdadeiro sentido das Escrituras. Depois de denunciar a errada doutrina que viviam ao modo deles, mas não de Deus, hoje Jesus também denunciam o modo como eles viviam (Alberto Maggi). O Evangelho deste domingo nos relata o momento em que Jesus se colocou em um lugar do Templo para ensinar à multidão e depois para observar as pessoas.
As palavras de Cristo são um grande alerta: “guardai-vos dos escribas”, isto é, “estejam atentos”, “em alerta” para não fazer a mesma coisa. Interessante que este alerta é sempre em relação aos religiosos da época e não contra os pecadores. Os escribas eram os responsáveis pelo ensino e interpretação das Escrituras no Templo. Estudavam e conheciam muito bem a Palavra de Deus e, por isto, se sentiam diferentes (privilegiados) em relação a todas as pessoas comuns e simples do povo.
O elenco de particularidades apresentado por Jesus revela como os escribas se comportavam: vestiam-se de modo a serem notados por todas as pessoas, exigiam que fossem tratados diferentemente em relação ao povo e revindicavam privilégios por causa de sua especial função de intérprete das Escrituras e da Lei de Deus. O sumo sacerdote (ele e o seu grupo também são criticado por Jesus bem como os fariseus) possuía em suas vestes sacerdotais pequenos sinos nas bordas para que todos notassem quando ele caminhava solenemente para cumprir sua função no Templo (cf. Ex 28,35). Os escribas exigiam privilégios em todos os lugares: pelas ruas, no mercado, nas festas (banquetes), nas sinagogas (lugar de oração) etc. Jesus critica e condena tais comportamentos, pois eram pessoas que estavam “aproveitando” do sagrado, da religião e até da Palavra de Deus para obterem privilégios e vantagens pessoais.
Jesus faz uma denúncia séria: os escribas se aproveitavam dos mais fracos, o Evangelho deste domingo menciona as viúvas. Estes falsos religiosos tinham criado uma forma de explorar as viúvas que necessitavam de assistência em relação às leis judaicas (eles eram também os profissionais nesta área), bem como da própria assistência do Templo. Por fim, segundo Jesus, até mesmo a oração que eles faziam (longas e em locais visíveis) era tudo um teatro para que fossem admirados por todas as pessoas.
Os sacerdotes, escribas e fariseus tinham transformado a religião e o templo em algo para interesse somente deles, exploravam as pessoas em proveito próprio e usavam os costumes religiosos para manipular o povo. Uma religião de aparências, roupas, rituais, costumes, longe daquilo que é a vontade de Deus.
Marcos nos conta que após o alerta ao povo sobre os escribas, Jesus foi se assentar em um local estratégico no Templo. Nesta área do lugar sagrado era onde as pessoas podiam depositar suas ofertas, era em uma parte do Templo em que as mulheres podiam permanecer. Sabe-se que lá havia 13 “caixas do tesouro” (“gazofilácio” em grego) sendo que 12 eram descriminadas e destinadas aos ofícios do Templo (para a lenha dos sacrifícios, óleo, limpeza, levitas etc.), as ofertas eram moedas do próprio Templo (não podia ser moedas romanas ou estrangeiras) que deveriam ser entreguem ao funcionário (ou levitas ou sacerdotes) que, por sua vez, colocava nos locais escolhidas pelo oferente. Segundo alguns estudos, esses cofres para o tesouro do Templo eram de bronze e o formato seria de um chifre (“shofar”). Na décima terceira caixa do tesouro do Templo, a própria pessoa podia colocar diretamente sua oferta, mas esse cofre não tinha uma discriminação sobre o destino das doações.
Pois bem, Jesus se colocou próximo exatamente desse último cofre do Templo. E começou a observar todos que lá se dirigiam para depositar suas moedas. Muitos faziam questão de fazer resoar as moedas quando estas caíam dentro do depósito do Templo, talvez daí o alerta de Jesus: “não tocar a trombeta quando deres esmola” (Mt 6,2). Após notar o “show” que promoviam os mais ricos com suas moedas, Jesus também percebeu uma viúva que lá deixou sua doação ao Templo. Ela, possivelmente, escolheu o último depósito de moedas, pois sua contribuição era muito pequena e se fosse feita em outros cofres, talvez tivesse sido questionada pela mísera quantia, já nesta última, ela mesmo, sem ser notada, poderia fazer sua oferta sem nenhum constrangimento.
As viúvas naquele tempo de Jesus viviam uma situação de quase desespero se não tivessem família (filhos para cuidar delas). Sem amparo familiar, deveriam viver de doações, esmolas ou até mesmo prostituição, pois não podiam trabalhar e se fossem mais idosas, não arranjariam novo matrimônio. Com sua vestimenta se sabia que se tratava de uma viúva, alguém pobre e simples. Jesus observou que também ela, em sua realidade de pobreza, sem ser notada por ninguém, também quis fazer sua oferta a Deus no Templo.
Ela depositou duas moedinhas que correspondiam a um “quadrante” que era a moeda de menor valor entre as moedas romanas (com um quadrante compravam-se alguns pães somente). Era tudo que tinha, poderia ter ficado com uma pelo menos, mas quis, silenciosamente e longe de todos os olhares doar “tudo que tinha”. Lembrando que as leis judaicas comandavam de assistir as viúvas (juntamente com os órfãos e os estrangeiros, cf. Dt 10,18; 24,17; 27,19 etc.) e não o contrário: elas é que estavam contribuindo para a manutenção da estrutura do templo.
A cena que passou despercebida por todos, foi notada por Jesus. Nosso Senhor, um pouco antes, tinha alertado para observar os escribas, mas de um modo crítico e ao elencar o modo de se comportarem, expôs seus erros e por isto, não deveriam ser imitados. Em relação a pobre viúva, Jesus faz o mesmo: convoca seus discípulos, revela aquilo que foi feito sem ser percebida e a coloca como exemplo para todos. Mais uma vez, Jesus “chama os discípulos a si”, eles tão perto de Cristo, mas longe de seus ensinamentos. A viúva tinha feito tudo em silêncio, simplicidade e segredo e tudo permaneceu oculto para todos, menos para Jesus.
A viúva prosseguiu seu caminho, mas seu gesto tornou-se um exemplo para os discípulos de Jesus. Ela talvez não conhecia Jesus, possivelmente nem tinha ouvido suas pregações, ela não fazia parte do grupo de discípulos, muito menos era da classe dos sacerdotes, nem conhecia provavelmente muita coisa das Escrituras, mas foi a pessoa que mais realizou algo expressivo para Jesus, pois fez tudo com verdadeira devoção e toda fé que possuía. Este é o verdadeiro discípulo que Jesus deseja ao seu lado.
Jesus não quis valorizar o “ato religioso” de doar algo ao Templo, pois esse tinha se tornado uma instituição que explorava os mais pobres. Jesus procurou chamar a atenção sobre a generosidade silenciosa daquela pessoa invisível para todos. Doou muito mais com o coração do que o valor que as moedinhas significavam. Discreta e generosa em doar sua vida a Deus, qualidades que valem muito mais que dinheiro e atos religiosos vazios e exibionistas.
A passagem da viúva que doa toda sua vida é a última pessoa valorizada com exemplo a ser seguido pelos discípulos. Depois disso, inicia-se em Marcos os textos da paixão de Jesus.
Na primeira leitura, temos o exemplo da viúva visitada pelo profeta Elias. Ela encontrava-se próximo do desespero, pois a farinha e o óleo estavam para acabar, ainda por cima, a região em que habitava com seu filho estava enfrentando uma grande seca. Não obstante tudo isto, a viúva deposita toda sua confiança em Deus e acode o profeta faminto. A sua fé não foi em vão, pois a sua confiança em Deus transformou em providência e a viúva e seu filho puderam enfrentar a carestia daqueles dias.
A pobre viúva no Templo sem se fazer notar pelas pessoas, mas com uma confiança e profunda capacidade de doar tudo, é assinalada como um discípulo ideal que Jesus procurava no Templo. O texto de hoje inicia com dois grupos de pessoas: os escribas exibicionistas e exploradores da fé e aqueles que jogavam grande quantidade de moedas no cofre de bronze para serem notados, mas são desprezados por Jesus; no entanto, com a viúva foi diferente.
Não é a soma e o dinheiro em si o mais importante para Deus, nem o fato de ser uma oferta dada ao Templo, mas a profunda confiança e fé em Deus que a levava a “doar toda sua vida” (melhor tradução para o final do Evangelho).
Jesus procura sempre insistir sobre qualidades fundamentais para alguém ser discípulo e a viúva deu o seu testemunho: fé profunda, tudo feito no silêncio, simplicidade, confiança total ao ponto de doar tudo se fosse necessário e tudo realizado a partir do coração.