#Reflexão: 3º domingo da Páscoa (23 de abril)
A Igreja celebra o 3º domingo do Tempo Pascal neste domingo (23). Reflita e reze com a sua liturgia.
Leituras:
1ª Leitura: At 2,14.22-32
Salmo: 15(16),1-2a.5.7-8.9-10.11 (R. 11ab)
2ª Leitura: 1Pd 1,17-21
Evangelho: Lc 24,13-35
CAMINHANDO COM CRISTO
A passagem conhecida dos discípulos de Emaús possui uma grande proximidade da nossa caminhada de fé como discípulos: não é “mais uma história” do ressuscitado, mas uma história de todos nós! Este texto também tem nos ajudado em nossa caminhada Sinodal.
Lucas nos diz que tudo aconteceu no primeiro dia da semana, logo depois do dia sagrado para os judeus: O Domingo. Esse dia se tornou para nós cristãos, o Domingo da Páscoa! Eram “dois discípulos”. Não foi mais uma experiência que aconteceu entre os primeiros escolhidos de Jesus (os apóstolos), mas com os discípulos. Um, nós sabemos o nome: “Cléofas” e o outro? Talvez Lucas tenha deixado sem nome para que hoje cada um se sinta representado pelo outro companheiro de estrada. Eles estavam se retirando de Jerusalém. Não era um retorno para sua vila, mas significava um abandono de tudo que tinham experimentado. Não sabemos quando eles passaram a fazer parte do grupo de discípulos, mas sabemos que viram e conheceram muito bem o Mestre Jesus.
Eles também tinham sido testemunhas da morte do Mestre Jesus. Para eles, tudo tinha sido encerrado no túmulo de Jesus e tudo tinha acabado! A morte não tinha atingido somente Jesus, mas a esperança e a fé dos dois discípulos, para eles, a morte na cruz cancelou todo o passado de Jesus e matou toda esperança de futuro.
Lucas nos diz que eles conversavam e discutiam (quase brigavam!) sobre o ocorrido. Os dois estavam fechados em seus pensamentos, mesmo trazendo em comum a mesma decepção. Discutiam, tentando entender tudo. Para eles, tudo tinha terminado e não tinha mais nada que fazer naquela cidade. Procuravam uma luz sobre o que tinham experimentado, mas nada os convencia a mudar de ideia, por isso, abandonavam Jerusalém.
Eram pessoas de fé, tinham experimentado muita coisa junto a Jesus (curas, milagres, poder, pregações…). Mesmo depois da ressurreição, eles ainda tinham ficado presos ao passado. Lucas nos diz que nesse contexto tão negativo e frustrante, Jesus se aproxima e começa a caminhar junto deles e procura entrar na conversa. Lembrando que tudo isso – segundo Lucas – aconteceu na manhã da Páscoa de Cristo. Ele se sujeita à tristeza e à amargura dos discípulos, percorre com eles quilômetros e caminha no ritmo de seus passos que levavam todos para longe de Jerusalém. Um novo modo de viver como Bom Pastor: não briga e nem os constringe a mudar seus passos, mas com paciência, entra em suas amarguras e frustrações e procura tocar seus corações. Desta vez, o Pastor segue os passos das ovelhas, procura reconquistá-las para depois resgatá-las.
Jesus, por fim, lança uma pergunta: “O que vocês estão conversando pelo caminho?” A conversa deles foi fervorosa e longa. Antes de introduzir a fala deles, Lucas nos fala como eles estavam: “rosto abatido”, profundo sinal de frustração! Cléofas fala pelos dois e retruca a pergunta de Jesus situando-a quase como uma ofensa (um insulto), como se quisesse machucá-los ainda mais. Eles não percebem que é Cristo Ressuscitado, mas o veem como a um estrangeiro, alguém desconhecido e distante. Mas, eram eles que tinham se distanciado de Cristo. Nosso Senhor se apresenta como alguém de fora, como um estrangeiro, que depois se revela profundamente consciente de tudo. “Alguém de fora” que iluminava o que estava acontecendo!
A frustração era muito semelhante ao sentimento de tantos que ainda hoje se deixam afogar por tudo de ruim do mundo e até mesmo dentro da Igreja. O olhar era de tristeza e não enxergavam mais nem mesmo a Cristo. Não conseguiam mais dialogar, mas somente acusar, são as frustrações no campo da fé.
Cléofas viu Jesus como uma pessoa cega para a realidade, eles viram e vivenciaram a tudo, mas o “estrangeiro” era visto como alguém fora da realidade, cego e que não ligava para o que todos estavam vivendo. O discípulo decepcionado continuou narrando para Jesus estrangeiro, tudo que eles tinham vivenciado: Jesus Nazareno, profeta em obras e palavras diante de Deus e dos homens, mas tudo se encerrou com ação dos religiosos da época que conseguiram dar um fim em Jesus, condenando-o a morte de cruz. Os dois discípulos tinham vivenciado tudo isso com intensidade, mas em um momento tudo se tornou uma grande frustração: a morte na cruz. Eles tinham visto alguém poderoso (Jesus), mas que teve um fim como o de qualquer pessoa. Para eles, o mal do mundo tinha prevalecido mais uma vez.
Jesus deixou que falassem, que colocassem para fora tudo de frustrante e decepcionante que estavam passando até descobre a raiz da frustração dos dois: o que eles esperavam realmente de Jesus, não aconteceu: “Nós esperávamos que ele fosse libertar Israel…”. Jesus terminou sua vida sem concretizar a esperança que eles alimentaram do Mestre.
Eles caminharam com Jesus, mas percorriam estradas diferentes no campo da esperança. A frustração foi uma derrota de algo que eles alimentaram em relação a Jesus, mas que o próprio Mestre nunca prometeu. Jesus ensinou, mas eles ouviram e alimentaram uma esperança somente em alguns pontos da vida de Jesus: o poder. Jesus nunca usou do poder para se impor ou conquistar, mas para fazer o bem. Eles queriam um poder sobre todos, Jesus viveu uma vida de serviço a todos e total doação. Não foi Jesus que os decepcionou, mas eles mesmos que não entenderam nada daquilo que Jesus viveu e ensinou.
Eles completaram a partilha com o estrangeiro dizendo que eles tinham ouvido algo novo (relatos da ressurreição), mas que para eles era pura fantasia, “coisas de mulheres”. A frustração não tinha somente deixado os dois tristes e abatidos, mas também cegos, a tal ponto que não enxergavam mais nada senão a desilusão sobre tudo que se encerrou na Sexta-feira Santa. Eles até tinham ouvido o anúncio da ressurreição por parte das mulheres e outros discípulos, mas faltava algo a mais para que os dois discípulos percebessem que algo novo estava se iniciando.
Então Jesus começou a falar com palavras fortes, quase que rebatendo o que Cléofas havia dito no início,: “Como sois sem inteligência e lentos para crer em tudo o que os profetas falaram!” Às vezes em nossa vida, algumas coisas funcionam como um grande “chacoalhão”. Na intimidade da caminhada, Jesus provoca os dois a repensarem em tudo. A primeira atitude de Jesus foi buscar no coração deles tudo o que eles tinham e conheciam: A Palavra de Deus. E Jesus fez um longo caminho de leitura da Bíblia, mas apontando que tudo já estava previsto por Deus. A Bíblia é o local especial para fazer a experiência de Deus. Nela, já escutamos e nos alimentamos de tudo que nos alegra o coração. Interessante que Jesus não procurou mudar o destino da jornada dos discípulos; não se mostrou imediatamente presente, mas foi através da Palavra de Deus que Jesus procurou penetrar em seus corações, pois eles estavam fechados para o passado; e não percebiam o presente da nova história, que eles, sem perceber, já estavam começando a escrever.
Pedro no seu discurso da 1ª leitura fez o mesmo: para iluminar o presente, ele se apoiou na própria Palavra de Deus. Acreditamos na Bíblia, acreditamos que tudo está conforme a vontade de Deus.
No cair da tarde, quando a noite começava a surgir, os discípulos já tinham ouvido tudo sobre o projeto de Deus na Bíblia. Tinham aberto os ouvidos e o coração estava aquecido e agitado com a Palavra de Deus, mas faltava completar tudo, abrindo seus olhos. Lucas disse que Jesus fez de conta que iria adiante. Toda intimidade da caminhada e da partilha da Palavra de Deus teria que desembocar no convite dos dois discípulos: “Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando!” Jesus respeitou e esperou ser acolhido! “Casa”, no Evangelho de Lucas, tem um forte sentido de coração! Cristo aceitou e entrou, mas não mais como um estranho, agora como amigo que se acolhe com alegria.
Dentro da casa, Jesus não se comportou como um convidado, e preside a celebração do pão (era sempre o pai da família que celebrava). Lucas narrou o que aconteceu no interior da casa, como aconteciam as celebrações dos cristãos e Jesus não foi servido como uma visita importante, mas sim como aquele que celebra o “partir do pão”. Durante o “repartir do pão”, finalmente, seus olhos se abriram. No gesto que conheciam muito bem do Mestre Jesus que sempre celebrava em refeições o encontro com as pessoas que tiveram seu ponto alto a Última Ceia, eles reencontraram com Cristo Jesus.
O caminho começou com uma fervorosa discussão entre os discípulos sobre tristezas e frustrações; agora, a Eucaristia trouxe novamente a presença de Jesus Cristo. Conversam novamente entre si, mas partilhando a alegria e o coração que ardia ao ouvir o peregrino Jesus que falava. Para nós a Palavra de Deus aquece e faz o nosso coração arder de alegria quando a ouvimos e meditamos tudo que Deus Pai realizou em Jesus Cristo. Na Eucaristia é que os olhos se abrem e tudo se torna claro e seguro.
Lucas nos fala que no momento em que seus olhos perceberam que se tratava de Jesus Ressuscitado, no momento que seus olhos se abriram, Cristo desapareceu da frente deles. De fato, se temos a Palavra de Deus e a Eucaristia, já temos tudo para sentir a presença de Jesus Cristo que caminha conosco. Tinham pedido ao peregrino Jesus: “fica conosco” e na Palavra de Deus e na Eucaristia, Jesus permanece sempre conosco.
O evangelista Lucas nos diz que a alegria dos discípulos foi tamanha que se levantaram e saíram; enfrentaram a noite que se iniciava para levar a notícia da experiência pessoal com Cristo, não mais no túmulo, nem com anjos ou através das primeiras testemunhas, mas na Palavra de Deus meditada e na Eucaristia celebrada. Está aí o caminho que temos que fazer. Era necessário testemunhar para os primeiros discípulos (os apóstolos e as mulheres) que Cristo ressuscitado pode ser experimentado com a mesma alegria como tinha acontecido com eles: longe de Jerusalém, nas casas, na celebração do “repartir do pão” sempre alimentados antes, com a Palavra de Deus.
A Eucaristia é para nós o maior tesouro e juntamente com a Palavra de Deus o melhor meio de continuar experimentando Jesus Cristo presente e vivo! Ela abre os olhos para vermos o mundo de uma forma diferente. Ele continua caminhando conosco pelas estradas da história, mas é no “repartir do pão” que nossos corações e nossos olhos são iluminados pelas alegrias de Cristo Ressuscitado.
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