#Reflexão: Solenidade da Assunção de Nossa Senhora (18 de agosto)
A Igreja celebra a Solenidade da Assunção de Maria, neste domingo (18). Reflita e reze com a sua liturgia.
Leituras:
1ª Leitura: Ap 11,19a;12,1-6a.10ab
Salmo: 44(45),10bc.11.12ab.16 (R. 10b)
2ª Leitura: 1Cor 15,20-27a
Evangelho: Lc 1,39-56
FESTA DA ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA
O que é específico do cristianismo é a esperança da ressurreição, a certeza de que a morte não tem a última palavra sobre a humanidade e de toda a criação, como nos diz São Paulo: “Cristo ressuscitou dos mortos, primícias dos que morreram” (1Cor 15,20); Ele é “o primogênito entre os que morreram” (Cl 1,18), foi Ele quem nos abriu o caminho e agora nos espera no Reino. Contudo, devemos reconhecer a nossa enorme dificuldade em aderir a esta realidade, da qual cada Eucaristia é um memorial. Em outras palavras, acreditamos realmente na vida eterna que nos espera após a nossa morte?
A festa da Assunção da Virgem Maria, da sua passagem deste mundo para o Pai, está no centro desta questão. Na tentativa de lhe responder, a Igreja indivisa compreendeu desde os primeiros séculos que em Maria, mãe do Ressuscitado, mulher que consentiu em si mesma o “maravilhoso intercâmbio” entre Deus e a humanidade, meta que espera cada ser humano, nela tudo foi antecipado: a assunção de tudo o que é humano e de cada ser humano na vida de Deus, para sempre: “Deus, tudo em todos” (1Cor 15,28). E assim, a grande Tradição da Igreja foi gradualmente proclamando Maria para além da morte, naquela outra dimensão da existência que só sabemos chamar de “céu”: Maria é a terra do céu, é as primícias e imagem da santa Igreja nos céus!
Afirmar isto sobre Maria não exige a realização de investigações complexas sobre o acontecimento da sua morte. Pelo contrário, para quem tem “um coração capaz de escutar” (cf. 1 Reis 3,9), basta ir ao início da história de Maria: o encontro entre Isabel e Maria, celebrado por esta última com o canto do Magnificat (Evangelho desta solenidade). É um texto de profundidade inesgotável que nos diz algo muito simples e fundamental: a vida eterna para cada um de nós começa aqui e agora, na medida da nossa capacidade de amar e ser amado, um amor que manifesta a verdade de nossa fé e nossa esperança.
Depois do anúncio da encarnação recebida do anjo, ao qual ela respondeu: “Aqui estou, sou a serva do Senhor, cumpra-se em mim a sua Palavra” (Lc 1,38), sem qualquer hesitação Maria que já carregava Jesus no ventre, vai ao encontro da sua prima Isabel; ela é animada pelo desejo de estar próxima de uma mulher idosa e que era estéril, mas a prima estava grávida, pela misericórdia de Deus, para quem nada é impossível (cf. Lc 1,37; Gn 18,14). O amor da jovem virgem de Nazaré enche a idosa Isabel do Espírito Santo, isto é, de amor, que reconhece prontamente a origem desta circulação de amor na fé de Maria: “Bem-aventurada aquela que acreditou que as palavras do Senhor são cumpridas!” (Lc 1,42).
Maria responde a esta aclamação entoando o Magnificat, isto é, lendo na sua vida as maravilhas operadas nela por Deus, as grandes obras de salvação resumidas e recapituladas no fragmento da sua existência; a sua exultação sabe abrir-se ao “ainda não” daquela justiça que só será completa no Reino, quando finalmente os famintos serão saciados de bens e os últimos serão os primeiros… Tudo isto está enraizado em algo muito concreto. Maria reconhece sobre ela o olhar amoroso de Deus: “Deus olhou para a humildade, para a pequenez da sua serva” (Lc 1,48), com aquele amor que só pede para ser acolhido. Não seria, talvez, este amor também capaz de nos chamar a todos de volta à vida sem fim, para transfigurar os nossos corpos de miséria em corpos de glória (Fl 3, 21)?
Sim, a fé de Maria e o seu amor, um amor que atua concretamente pelos outros porque foi vivido concretamente nela mesma, dizem melhor do que muitas palavras a sua capacidade de vida plena, aquela vida que não se esgota aqui na terra. Este tornar-se carne do amor de Deus e esta entrada de toda carne no espaço de Deus é o que devemos lembrar quando cantamos o Magnificat. É isto que devemos viver e esperar todos os dias, para nós e para todos.
Tanto para a Igreja do Oriente como para a Igreja do Ocidente cristão, a “Assunção de Maria” (ou “Dormição de Maria”) é um sinal das “realidades últimas”. Um sinal da plenitude que anseiam os nossos limites: nela sentimos a glorificação que espera todo o mundo no fim dos tempos, quando “Deus será tudo em todos” (1Cor 15,28). É a porção da humanidade já redimida, figura daquela “terra prometida” à qual somos chamados, uma faixa de terra transplantada para o céu, como diz um hino da Igreja Ortodoxa Sérvia que canta Maria como “terra do céu”, mas uma terra redimida, semelhante a Cristo, transfigurada graças às energias do Santo Espírito, uma terra agora em Deus para sempre, antecipação do nosso destino comum. (Tradução de Enzo Bianchi, 2021).
“Virgem, anel de ouro do tempo e da eternidade, você traz nossa carne para o céu e Deus em nossa carne (D. M. Turoldo). Anel de ouro, onde o tempo e a eternidade se fundem, onde as fronteiras se cruzam: a carne da mulher no paraíso, a carne de Deus na terra. A assunção de Maria hoje canta o canto do valor do corpo. Deus não desperdiça as suas maravilhas e o corpo humano, que é tecido de maravilhas, terá – ao ser transfigurado – o mesmo destino da alma, e Deus ocupará o coração e o corpo e “[Cristo] será tudo em todos” (Cl 3,11). Este corpo, tão frágil, tão sublime, tão querido, tão doloroso, sacramento de amor e por vezes de violência, no qual sentimos a densidade da alegria, no qual sofremos a profundidade da dor, vai se tornar, no último dia, porta aberta, limiar escancarado à comunhão, transparência cristalina, sacramento do encontro perfeito. Maria é a irmã que seguiu em frente, o destino dela é o nosso, e já agora. “Vi uma mulher vestida de sol, que estava grávida e chorava de dores de parto” (Ap 12,2).
Linda imagem da Igreja, da humanidade, de Maria, de mim que sou um coraçãozinho ainda vestido de sombras. O que revela a nossa vocação comum: estar na vida, ser doadores de vida. Sendo criaturas solares, gerando vida e lutando contra o mal, o grande dragão vermelho que devora a luz, que come os frutos da vida. Tenha um coração de luz, envie apenas sinais de vida ao seu redor, e nunca desista. Porque o futuro do mundo não está grávido de morte, mas de vida. O Evangelho diz que “Maria partiu rapidamente para a montanha”. Ela é a mulher do caminho feito com pressa, porque o amor está sempre com pressa, não suporta atrasos; vai, levada pelo futuro que ganha carne e calor dentro dela. Uma mulher em caminho, que é sempre figura de uma busca interior, de um caminho para um mundo novo no caminho de Deus e nas esperanças do coração. Mulher a caminho dos outros: Maria nunca está sozinha no Evangelho, nunca arranjou para si um espaço, por pequeno que fosse, para reservar para si. Ele vai continuamente ao encontro dos outros, criatura de comunhão, ponto de encontro. Mulher que viaja de casa em casa, que sai da sua casa de Nazaré e vai até Isabel, ao casal de esposos de Caná, a Cafarnaum, à cenáculo de Jerusalém, como se a sua casa se tivesse ampliado, como se o seu coração estivesse se multiplicado. Mulher viajando com alegria, alegria e medo juntos, alegria que vira abraço e depois música ao encontrar Isabel. Porque a alegria, tal como a paz, tal como o amor, só pode ser experimentada ao ser partilhada.
A Assunção é a celebração da nossa “migração” (viagem) comum da vida aqui para a vida eterna. Somos uma humanidade dolorosa, mas comovente; humanidade ferida, caída, mas avançando; humanidade que conhece bem a traição, mas que não desiste, que ama o céu e a terra com a mesma intensidade. (Tradução de Ermes Ronchi, 2021).