#Reflexão: 29º domingo do Tempo Comum (22 de outubro)

17 de outubro de 2023

A Igreja celebra o 29º Domingo do Tempo Comum, neste domingo (22). Reflita e reze com a sua liturgia.

Leituras:
1ª Leitura: Is 45,1.4-6
Salmo: 95(96),1.2a.3.4-5.7-8.9-10a.c (R. 7ab)
2ª Leitura: 1Ts 1,1-5b
Evangelho: Mt 22,15-21

 

Acesse aqui as leituras.

 

DAR A DEUS O QUE É DE DEUS

A passagem do Evangelho de Mateus deste domingo é muito conhecida e também muito utilizada para expressar a necessidade de manter separadas duas coisas, mas o ensinamento de Jesus vai muito além disso.

Na primeira leitura, temos um trecho do profeta Isaías que recorda a grande importância do rei Ciro que era pagão, mas foi um grande instrumento de libertação para o povo. Segundo Isaías, o rei pagão mesmo sem conhecer a Deus, permitiu que os exilados que estavam na Babilônia retornassem para a terra de Israel. Ciro, inclusive, financiou a reconstrução da cidade e do novo Templo. Para o profeta, Deus é que governa tudo e tudo somente acontece com a sua permissão. Para Deus, não há separação entre os poderes neste mundo, pois tudo deve concorrer para o bem de todos e Deus está pronto a ajudar a todos.

Esta questão entre o poder temporal (governos deste mundo) e Deus está por detrás da questão apresentada pelos opositores de Jesus no Evangelho de Mateus. Mas, há alguns particulares que nos ajudam a entender e aprofundar ainda mais esta questão.

É fundamental recordar que a discussão apresentada pelos inimigos de Jesus aconteceu dentro do Templo na área em que todo o povo poderia circular, inclusive os não judeus. Este local (cerca de quase 4 campos de futebol) tinha no centro o Santuário, local sagrado onde aconteciam os principais rituais judaicos. Fora do Santuário estavam os vendedores de animais e aqueles que trocavam moedas dos romanos pelas moedas que podiam ser usadas dentro do Santuário. Lembrando ainda que Jesus contou duas parábolas que ouvimos nos dois domingos passados para os principais dirigentes judeus da religião judaica e esses resolveram – nesta área pública do templo – iniciar um debate para tentar desmascarar Jesus diante da população que o estimava.

O início da passagem nos informa que os fariseus “saíram” do Templo para, assim, fora dele, tramarem algo contra Jesus (algumas traduções e lecionários não apresentam este detalhe). Eles não queriam debater e aprofundar algum aspecto novo da fé judaica ou das Leis de Deus, mas apresentar a Jesus uma questão que dependendo da resposta, eles pudessem acusar Jesus de algo. Uma vez que Ele estava no Templo, a acusação poderia ser considerada muito grave e até decisiva contra Jesus.

Os fariseus elaboram uma questão, mas como são falsos e sem caráter, mandam “seus discípulos” para provocar Jesus com uma pergunta que era mais uma armadilha do que um debate teológico. Mateus ainda nos informa que junto com os seguidores dos fariseus também fizeram parte da comitiva, os herodianos que representavam o poder temporal uma vez que apoiavam o governo de Herodes. Estes dois grupos sempre foram inimigos, pois os fariseus não aceitavam, de forma nenhuma, as imposições de Roma através de seus administradores; já os herodianos procuravam manter o governo do império romano na cidade. Mas, o mal costuma se unir para produzir mais coisas ruins ainda (e o bem é unido?).

Tudo gira em torno de palavras e atitudes que revelam que eles estavam a serviço do mal, por isto, o discurso inicial nada mais é do que “palavras vazias” que eles mesmos não acreditavam, no entanto, eles queriam tentar iludir Jesus com elogios.

Chamam Jesus de “Mestre” e assim, colocam a ideia principal e a condição fundamental para acusar Jesus: “Ele é um falso mestre!” Ao afirmarem que Jesus é “verdadeiro”, querem dizer que as suas respostas são incontestáveis e por isto, Jesus não poderia recuar em uma resposta; “ensinas o caminho”, dizendo desse modo eles sustentavam que sua doutrina tem o poder de conduzir ou não a Deus, mas se Jesus respondesse mal, Ele estaria conduzindo a todos para o caminho da condenação e da perdição; eles ainda afirmam que Jesus é “autônomo” em suas respostas e ensinamento, e aquilo que está afirmando não é uma repetição de outros mestres; “não olha para a aparência”, isto é, não se deixa influenciar por nada e ninguém.

Estas palavras mais do que elogiosas são princípios que condicionavam e tornavam mais profundas e com inúmeras consequências, qualquer resposta de Jesus. Se Jesus respondesse mal, tudo o que Ele representava para o povo deveria ser rejeitado. Eles queriam mostrar a “hipocrisia” de Jesus, mas é o Mestre Jesus que mostra que eles é que são hipócritas.

A pergunta é apresentada como alguém que pede uma simples opinião. Formulam a questão sem dar um caráter de inquisição, pois a resposta é que pensavam que eles poderiam instrumentalizar da forma que bem entendesse. A pergunta aparenta ser simples, mas era uma armadilha, pois as duas respostas comprometeriam Jesus. Querem a opinião de Jesus se era “lícito” (legal) ou não pagar o tributo a César. Se Jesus falasse que sim, os fariseus iriam acusá-Lo de ser favorável a exploração dos romanos; se Jesus dissesse que não, os herodianos acusariam Jesus de ser um rebelde e agitador de revoltas contra Roma.

Jesus mostra, inicialmente, que não se deixa iludir nem pelos elogios e nem pela pergunta apresentada quase que sem muita pretensão. Nosso Senhor sabia que se tratava de uma armadilha e que as palavras dos opositores eram somente expressão de uma vida hipócrita seja diante das pessoas como também diante de Deus. Jesus inicia sua resposta deixando claro a verdadeira intenção deles e os qualifica como “hipócrita”: pessoas de duas faces (uma moeda tem duas faces).

Era necessário mostrar que eles, de fato, é que eram falsos, assim, Jesus pede que eles mostrassem uma moeda que era usada para pagar o tal imposto de César (a moeda para o tributo era de prata). Ao mostrarem a moeda de César, Jesus mostra que são os opositores que possuíam a moeda e não Ele. Tudo indica que Nosso Senhor não pegou a moeda, pois logo em seguida, Ele pergunta de quem é a “face” e o que estava escrito na moeda. Ao responderam, os opositores reconhecem a imposição de César e suas palavras de dominador, presentes na inscrição. Lembrando que o imperador na época de Jesus era Tibério e ele usava também o título de “César” por pertencer à família de Júlio César.

A pergunta foi clara, mas Jesus responde de uma forma diferente e mais ampla. Eles perguntaram se era “lícito” (correto, legal), mas Jesus responde que se devia “restituir” a César o que era de César. Para Jesus, não havia nenhum problema em dar aquilo que é devido a César. Nosso Senhor ainda esclarece que aquilo que se paga não deve ser visto como uma imposição, mas uma “restituição”, assim, os impostos e taxas não seriam nem algo ruim ou bom, mas uma responsabilidade do cidadão. Mas, há uma novidade na resposta de Jesus. Ele completa com palavras idênticas: “Dar de César (pertence, é de César) a César; | de Deus (pertence, é de Deus) a Deus”. Na resposta, Jesus troca o “lícito” (uma lei, algo correto ou legal) por “restituir” (algo gratuito, generoso, que se reconhece o valor).

Para Jesus, cada um deveria também dar a Deus aquilo que é de Deus. A Cesar deveria se pagar o imposto devido, mas a Deus o que se deve restituir? No exercício que Jesus fez com seus opositores, nós encontramos a resposta. A moeda trazia o rosto de Cesar. O “rosto” que devemos restituir a Deus são as pessoas, pois cada ser humano é rosto de Deus (imagem e semelhança de Deus).

Jesus convoca a todos para devolver a Deus cada pessoa com uma face que seja digna e justa, pois nós somos imagem de Deus. A questão assim, para Jesus não estava localizada sobre uma questão material para César (moeda e imposto), mas aquilo que precisamos dar e restituir a Deus (cada pessoa, rosto de Deus). Eles procuraram armar uma armadilha contra Jesus, mas são eles que caem na própria armadilha.

Para Nosso Senhor não há nenhum “problema” com os impostos, mas sim com as pessoas, pois essas é que devem ser apresentadas a Deus com dignidade (“restituídas” a Deus), pois essas é que são a face de Deus neste mundo. Paulo na 2a leitura nos lembra os pilares da nossa caminhada para sermos imagens de Deus e do Seu Filho Jesus: “a atuação da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança em nosso Senhor Jesus Cristo”.

Dar a “Deus o que é de Deus”. Fica a pergunta para nós: Quanto estou dando a Deus através da promoção das pessoas? O tempo que tenho para as coisas do mundo (“César”) é igual ou maior que aquilo que reservo para Deus?

 

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