#Reflexão: 31º Domingo do Tempo Comum (Ano B – 31 de outubro)
A Igreja celebra neste domingo (31) o 31º domingo do Tempo Comum. Reflita e reze com a liturgia deste dia.
1ª Leitura – Dt 6,2-6
Salmo – Sl 17,2-3a.3bc-4.47.51ab (R. 2)
2ª Leitura – Hb 7,23-28
Evangelho – Mc 12,28b-34
AMAR A DEUS NO PRÓXIMO
Pe. Dirlei Abercio da Rosa
Presbítero da arquidiocese de Pouso Alegre,
mestre em Ciências Bíblicas (Instituto Bíblico, Roma)
e professor da Faculdade Católica de Pouso Alegre
Na passagem deste domingo do Evangelho de Marcos, Jesus se encontra já dentro do Templo de Jerusalém logo depois da entrada na cidade (Mc 11,1ss). No lugar mais sagrado para os judeus, as pessoas se aproximavam de Jesus para ouvi-Lo, mas alguns se sentiam incomodados e ameaçados. São os entendidos da religião e na Lei de Deus. A religião para eles tinha se tornado uma grande discussão de princípios, normas e costumes, mas vazia de bons sentimentos. Marcos nos diz de sete debates dentro do Templo com os principais da religião de Israel. Neste domingo, é a quinta discussão.
Depois de uma discussão com um grupo sobre a ressurreição (Mc 12,18ss), um escriba (mestre da Lei) propôs uma questão que – podemos dizer – era central para a religião do povo de Deus e o ponto de partida de todos os preceitos. Ele se aproximou e sem utilizar nenhum título, propôs diretamente a questão a Jesus: “Qual o primeiro de todos os mandamentos?” Sabemos que a religião judaica iniciou com os 10 Mandamentos dados por Deus a Moisés. Com o passar dos anos, os responsáveis pela religião do povo foram acrescentando outros preceitos e obrigações. E, num tempo próximo de Jesus, o fiel judeu tinha que observar mais de 613 prescrições, sendo 365 proibições (um por dia) e 284 preceitos positivos (quantidade de elementos do corpo que se conhecia). O pior de tudo é que se ensinava que todas as prescrições tinham a mesma importância e valor e deveriam ser observados radicalmente.
Mas, a pergunta do mestre da Lei tinha ainda outro detalhe. De todos os Mandamentos (os 10 de Moisés e todos os demais que foram acrescentados), eles ensinavam que um era especial, pois o próprio Deus Javé guardou: o sábado. Conforme Gênesis (2,2), no sétimo dia, Deus descansou. O entendido das Lei na Bíblia pensava colocar Jesus em uma situação embaraçosa, pois Ele curava as pessoas também em dia de sábado.
Jesus, no entanto, levou o escriba ao ponto principal de qualquer religião. Tudo iniciou com “Ouve Israel”. Seria fundamental escutar primeiro e praticar depois. Jesus recordou da profunda unidade em Deus: “Nosso Deus é um só Senhor”. Depois, Ele não criou nada de novo, mas propôs o princípio que devia mover a todos que pretendem fazer um caminho de Deus: o amor. Citando uma passagem do AT (Dt 6,5), que ouvimos na 1ª leitura, Jesus lembrou que o amor deve ser a principal motivação para se aproximar de Deus. Um amor intenso e completo: com teu coração, com tua alma, com teu pensamento e com tua força. A iniciativa deveria ser sempre completa (“toda”), pessoal (“teu”) e envolver todo o ser da pessoa. Amor não seria um momento, um ato ou uma intenção, mas um ser que respira e vive movido pelo amor. Em relação ao texto original, Jesus acrescentou por conta própria “com tua alma”. Religião é muito mais que seguir preceito, regras ou ainda costumes, mas uma forma de viver amando.
O entendido queria saber qual era o “primeiro”, mas Jesus mostrou que esse preceito não teria como existir se não tivesse outro que todos deveriam também viver e praticar: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. Como tudo antes foi colocado como pertencente à pessoa, “teu coração”, “tua alma”, Jesus propôs também “teu próximo”. Notemos que Jesus não disse “crer ou adorar a Deus”, mas “amarás” uma forma intensa e vibrante como uma obrigação que se impõe para viver. Crer em Deus já era algo considerado normal e natural para o judeu. O preceito que Jesus resgatou estava lá entre as primeiras páginas da Bíblia, como um princípio que deveria direcionar toda a história do povo de Deus. No entanto, com o passar do tempo, a religião tornou-se um lugar para cumprir preceitos, guardar regras rituais, e o amor foi deixado de lado.
Jesus juntou dois mandamentos em um só e isso foi novo para o escriba. Em Mateus (22,34), Jesus diz que “são semelhantes”. O “próximo” deve ser amado com a mesma intensidade: “amarás”. Nos ensinamentos e nas práticas da vida de Jesus, entendemos que cada pessoa é o lugar privilegiado para se amar a Deus. Ele não se confunde com as pessoas e coisas, mas cada pessoa é um modo especial de fazer a experiência da fé e do amor de Deus. O mandamento novo praticado por Jesus, “amar o próximo”, torna-se a melhor forma para mostrar o amor de Deus no mundo, pois cada pessoa é presença de Deus (imagem e semelhança) na terra.
Jesus recordou para o escriba, entendido na Lei, que tudo isso já estava ao alcance de todos, mas que foi esquecido pela maioria. O amor é que dá sentido a nossa vida, por isso, “amar o próximo como a ti mesmo”. Como preservamos nossa vida e vivemos, assim, devemos amar o próximo. Jesus recordou que a nossa existência está diretamente ligada a existência do próximo. Jesus no Evangelho de São João aprofundou essa questão lembrando que o modo como Jesus amou o próximo é que deve ser seguido: “amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12). É o sacrifício perfeito do amor realizado uma única vez, conforme ouvimos na 2ª leitura.
A resposta de Jesus encantou o escriba. Ao responder a Jesus, ele introduz, agora, sua fala com o título “Mestre” e faz questão de reforçar a resposta de Jesus, mas do jeito que ele aprendeu: “amá-lo [Deus] com todo o coração…com todo entendimento… todas as forças”. Ele retirou o acréscimo de Jesus: “com a tua alma”. Uma resposta de escola, pois não diz diretamente “teu coração… tua alma”. No entanto, aceitou a proposta de Jesus de unir os dois preceitos como sendo um só mandamento: amar a Deus e amar o próximo. Desta vez, é o escriba que acrescentou e concluiu que os dois princípios feitos um único mandamento, o qual valia “mais do que todos os holocaustos e sacrifícios” que eram realizados no Templo, local mais sagrado para o judeu. O amor a Deus e ao próximo supera o que é feito no lugar sagrado, pois deve ser praticado na vida e no dia a dia.