Direitos Humanos Fundamentais e DSI

16 de dezembro de 2022

No dia 10 de dezembro, foi comemorado o 74º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Essa declaração foi adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (resolução 217 A III), no dia 10 de dezembro 1948, pelos países constituintes da ONU, sem nenhum voto contra. Os chamados Direitos Humanos ou Direitos da Pessoa Humana são princípios adotados por todos os países do mundo e que se propõem a reger as relações desses países e suas instituições com os cidadãos e cidadãs e o conjunto da sociedade. A Declaração estabelece, pela primeira vez, a proteção universal dos direitos da pessoa humana. Desde sua adoção, a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi traduzida em mais de 500 idiomas – o documento mais traduzido do mundo – e inspirou as constituições de muitos Estados e democracias recentes.

Porém, os Direitos Humanos não são feitos para defender bandidos? Essa é uma pergunta frequente devido à extensiva divulgação por algumas mídias de que os defensores dos Direitos Humanos são defensores de bandidos. Diante desse questionamento, é interessante fazer duas perguntas:

1. Quem é que afirma serem os Direitos Humanos direitos de bandidos?

2. A quem interessa e a quem incomoda a defesa dos Direitos Humanos?

Uma tentativa minimamente séria de responder a essas perguntas vai mostrar que a defesa dos Direitos Humanos interessa a todas as pessoas que possam ter seus direitos fundamentais desrespeitados e que incomoda a quem tenha interesse em desrespeita-los. Por exemplo: interessa ao trabalhador e à trabalhadora que desejam sustentar sua família com um salário justo correspondente a uma jornada de trabalho. Desejam também que o seu trabalho não seja acima de suas forças e em condições adequadas às condições mínimas de segurança e à saúde humana. Não interessa a quem, porventura, deseja pagar um salário injusto e impor uma jornada exaustiva e/ou manter o trabalhador sob condições inumanas de trabalho com a finalidade de aumentar seus lucros pessoais ou de sua empresa, sem se preocupar com as condições de vida dos empregados. Para além disso, é importante frisar que a pessoa em conflito com a lei, os que a mídia corporativa e empresarial gosta de chamar de bandidos, como uma forma de tirar-lhes a humanidade, tem os seus direitos fundamentais e esses direitos precisam ser respeitados, inclusive pelo Estado. Sobre isso, podemos citar a situação dos presídios no Brasil que são constantemente motivo de denúncias de violação dos Direitos Humanos. Normalmente, essas denúncias são por que o Estado, ao recolher uma pessoa à reclusão, sob sua guarda, deixa de cumprir a lei que assegura a essas pessoas as condições mínimas de dignidade.

Por que a Igreja Católica defende os Direitos Humanos? Não só defende como é a instituição internacional que mais os defende, não obstante tenha demorado alguns anos para reconhecê-los. Não só a Igreja Católica, mas a maioria das Igrejas Cristãs e religiões do mundo. Fiquemos com a Igreja Católica e sua Doutrina Social.

O Compêndio da Doutrina Social da Igreja (DSI), de 2005, nos números 152 a 159, trata, especificamente, dos Direitos Humanos. Afirma que, teologicamente, os Direitos Humanos fundamentam-se na verdade cristã de que o Filho de Deus assumiu plenamente o “humano”. Essa verdade está no âmago da fé católica, a tal ponto que, no Evangelho de João, Pilatos apresenta Jesus às turbas dizendo: “Eis o homem!” (Jo 19,6). De fato, em Jesus, contemplamos a realização plena do ser humano, de tal maneira que a figura-mistério de Jesus Cristo torna-se o ponto de referência do mistério do homem.

Embora a dimensão dos Direitos Humanos tenha sua fonte no cristianismo, com a valorização do ser humano e a concepção de pessoa humana, os Direitos Humanos não foram, de início, aceitos pela Igreja. A aceitação dos Direitos Humanos, no âmbito eclesial, fez um percurso, que se abre com Leão XIII, ao iniciar um processo de diálogo com a modernidade, que fora fechado por seu predecessor, Pio IX, com o Syllabus – condenação dos erros da modernidade (1864).

A recepção católica dos paradigmas da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que passou pelo magistério de Pio XII, foi completada por São João XXIII com a Pacem in Terris, em 1963. Nessa encíclica social, o Papa Bom, reconhece a Organização das Nações Unidas e a sua declaração dos Direitos Humanos, promulgada em 1948.

O cristão e a cristã que se sente membro da Igreja Católica é convidado, em sua ação, defender e aprofundar seus estudos sobre os Direitos Humanos e dar a sua contribuição para a reflexão sobre eles. A Doutrina Social da Igreja oferece a formação suficiente e necessária para quem deseja atuar na defesa dos direitos humanos.

Ao completar 74 anos de sua proclamação, a Declaração Universal dos Direitos Humanos deixa como legado uma imensa lista de ações que resultaram na preservação da vida digna para milhões de pessoas em todo o mundo, como Jesus nos explicita ser sua missão (Jo 10,10). Deixa, sobretudo, uma crescente consciência universal da inviolabilidade desses direitos. Porém, aponta um longo caminho ainda a percorrer, pois, mesmo com o avanço da civilização e da modernidade, muitos direitos fundamentais, sobretudo de pessoas em situação de vulnerabilidade, são negligenciados e negados.