#Reflexão: 4º Domingo da Quaresma (27 de março)
A Igreja, neste domingo (27), celebra o 4º Domingo da Quaresma. Reflita e reze com a sua liturgia.
1ª Leitura – Js 5,9a.10-12
Salmo – Sl 33,2-3.4-5.6-7 (R.9a)
2ª Leitura – 2Cor 5,17-21
Evangelho – Lc 15,1-3.11-32
PARÁBOLA DO PAI MISERICORDIOSO
A parábola do Filho Pródigo é um dos maiores tesouros deixados por Jesus para compreendermos quem realmente é Deus Pai. Lucas nos diz que o motivo que levou Jesus a contar essa belíssima história de um pai com dois filhos está ligado à questão da acolhida por parte de Cristo de pessoas consideradas pecadoras pelos judeus. Esta conhecidíssima parábola não diz somente quem é Deus Pai. Ela também nos questiona sobre a nossa imagem de Deus. A primeira e a segunda leituras nos lembram de “momentos de passagens”. O povo de Deus, entrando na Terra Promessa, deixa para trás o maná, pois poderá trabalhar e produzir na terra que iria herdar. Paulo nos recorda da passagem do pecado para a salvação que a fé em Cristo deve nos conduzir. A parábola de Jesus é um grande convite a entrarmos verdadeiramente no coração de Deus Pai e abraçar o modo novo e cheio de misericórdia de Deus Pai para com cada um de nós.
Jesus, na parábola, inicia descrevendo uma realidade cotidiana: um pai e dois filhos. Observando o modo de comportar-se do pai nessa história, notamos que ele é pouco racional, lógico e legalista em seus atos e comportamento. Faz tudo movido muito mais pelo coração e sentimentos, deixando de lado regras, quando se tratava de resgatar uma pessoa. Podemos dizer que ele é muito mais “mãe” do que “pai”, ou melhor, ele é pai e mãe ao mesmo tempo. É o melhor exemplo do que significa “compaixão”: ir ao encontro e abraçar com ternura.
Apesar dos bens que ele possuía, o pai sempre esteve interessado somente nos filhos, mas respeitava as escolhas e atitudes dos dois. Os discursos e interesses dos filhos se limitam à posse, perda, aos privilégios e exclusão dos bens da família. O Pai, do início ao fim, está interessado na verdade e felicidade dos dois filhos. Isso eles são chamados a descobrir pessoalmente. Temos, na história, um Pai que ama a liberdade dos filhos.
Os bens acumulados pelo pai serviram somente para despertar no filho mais novo um desejo crescente de busca pela felicidade. Na casa com seu pai, irmão e servos, o caçula pensava que tudo que era comum a todos e o que ele tinha não era suficiente para ele ser feliz: ele queria ter somente para si, para usar do seu modo, onde e com quem quisesse. Ao pedir sua parte na herança, ele decreta o rompimento total com seu pai: herança se divide quando o pai morre. Ele não quis esperar esse momento. Tendo seu pai e irmão ao seu lado, ele vivia com outros sonhos, em outros lugares que ninguém de sua casa fazia parte. Um sonho somente seu, sem ninguém de sua família.
Como muitos, o filho caçula procurava felicidade nas coisas materiais, mas isso jamais seria suficiente. O coração do ser humano não se preenche com coisas, mas com pessoas. Ao abandonar sua casa, deixa para trás tudo que sempre possuía e que poderia, desde o início, lhe proporcionar felicidade: sua família e a sua casa. Pensava que ganharia tudo de bom dando as costas para os verdadeiros tesouros em sua vida: ele considerava mais as coisas materiais e riquezas, que faziam somente peso em seu coração e em sua vida.
“Parte para terra estrangeira”. O filho não abandona somente sua família, mas dá as costas a todas as suas raízes e até mesmo a fé em seu Deus. Liberdade para ele era se desligar de tudo que já experimentara. Quando perde tudo de material (dinheiro e bens pessoais), encontra-se sozinho em meio aos porcos (esse animal, além da sujeira, era considerado impuro pelos judeus). “Ele cai em si”: talvez ele nunca tivesse realmente “entrado” em si mesmo para saber onde estava o seu verdadeiro tesouro. Quando perde tudo de material, ele se lembra das pessoas (seu pai e os servos) e do mínimo que possuíam (pão em abundância na mesa). Ele deixou um pai e ganhou um patrão desconhecido; abandonou a mesa com pães para comer lavagem de porcos. Desprovido de tudo, ele se lembra de “na casa de meu pai”. Ele que queria “ser livre” se encontrava roubando comida dos porcos.
A motivação da volta do filho não foi por princípios nobres. Sua conversão não foi por remorso pelo que fez ou por ter se arrependido da sua loucura, mas por não ter o que comer. Ele retorna a sua casa porque está com medo de morrer de fome. Porém, seu pensamento ainda se mostrava errado em relação ao seu pai. Não volta buscando um Pai, mas um patrão. Não retorna por senso de culpa, mas devido à fome. Não se dirige a sua terra por amor, mas por medo de morrer de fome.
Entretanto, para o Pai (Deus), nada disso tem importância. Para Ele, não importa quais são os motivos que nos levam para os seus braços. A motivação da volta do filho foi a “saudade dos pães de casa”. Para o Pai, o importante é retornar a casa. O essencial é caminhar em direção a Ele e dar os primeiros passos.
Ao se aproximar da casa do pai na condição mais baixa e suja que se encontrava, o filho menor ensaia algumas palavras que não têm nenhuma importância e sentido para o Pai. Para Deus, basta o desejo de retornar ao seu convívio para Ele sair ao encontro. O filho volta caminhando. O Pai sai correndo ao seu encontro ainda na estrada. O filho, ao invés de se jogar aos seus pés, recebe o pai, o qual se lança ao seu pescoço para abraçá-lo (não para sufocá-lo). O filho estava sujo e impuro, maltrapilho e fedendo. O seu pai se abaixa para resgatá-lo não se importando em se sujar e se contaminar ao abraçar seu filho. É um Pai (Deus) eternamente aberto ao encontro.
O filho apresenta ao seu pai outro discurso: o primeiro foi para pedir sua parte da herança, agora, para pedir pão. Ele ainda estava amarrado ao passado e pensando que perdera seu pai, por isso almejava um lugar entre os servos. Porém, para o Pai, basta o retorno do filho aos seus braços. Na casa do Pai, ninguém passa necessidade. Todos têm tudo em abundância. Antes, o filho não percebera isso, pois o Pai era e continua sendo a fonte de tudo de que eles precisavam.
O Pai (Deus) lhe perdoa tudo, pois quer resgatar o filho e procura refazer tudo que fora perdido, ações simbolizadas no anel, na roupa e no banquete. O filho é perdoado não com decretos e sentenças, mas com gestos, beijo, carinho e festa. O abraço e a festa selam o tempo novo. O passado ficou para trás e serviu para trazer o filho cheio de vazios para que o pai pudesse encher com seu amor. Para o Pai, o importante é o presente e o futuro, por isso, faz-se festa e todos se alegram: o passado ficou no passado.
O Pai se alegra, pois o que sempre foi importante para ele era a presença do seu filho, que ele resgatara em seus braços são e salvo. O filho que antes girava entre coisas e muitos sonhos descobriu, no abraço do seu Pai, que a maior riqueza que ele sempre teve e não valorizou era o seu pai e a sua casa. Ele descobriu o rosto, o beijo e o abraço quando perdeu tudo de material. Entre os porcos, ele sentia que não tinha nada mais neste mundo. Entretanto, ele estava enganado, pois o seu verdadeiro tesouro nunca esteve em seu bolso e em suas mãos, mas no abraço do seu pai.
O irmão mais velho não se mostrou tão diferente do seu irmão mais novo. Com ele, a parábola ganha a profundidade desejada por Jesus. A cena deixa a festa e a alegria da casa para contar a história do filho mais velho. Ele retorna do seu trabalho. Ele escuta a música, mas não sorri. Esse filho é um bom trabalhador, obediente, mas infeliz. É triste, pois não ama o que faz e não faz as coisas que ama.
Em seu discurso na estrada e fora da casa, como o filho mais novo, o filho mais velho se mostra também longe da casa e do seu Pai. O filho mais velho vê o Pai como um patrão e trabalha esperando algum retorno material (um cabrito). Ele tem inveja do seu irmão, o qual é desconsiderado na conversa com o Pai, chamando-o de “seu filho”. O mais novo esbanjou tudo com prostitutas. O mais velho sonha festejar com os amigos. O Pai também não faz parte dos projetos do mais velho.
Mais uma vez, o Pai Misericordioso se mostra aberto para abraçar e acolher, unir e redimir, encher de compaixão e derramar seu amor. Ele procura mostrar para o filho mais velho o essencial de tudo: a vida, o irmão, a alegria, a partilha e a festa pelo retorno. Um coração cheio de leis e obediência serviçal jamais entenderá o que significa a generosidade que somente a Misericórdia de Deus possui.
A parábola se encerra deixando uma grande questão: o filho mais velho também entrou na casa?